sábado, 26 de junho de 2004

.:: Em tempos de consumo de pornografia ::.

Os meus pensamentos andam voltados sobre tudo que envolve este tema, desde significado/significante (*Ps.: A abordagem do inconsciente em Levi Strauss, baseada nas teorias de Lacan, é muito interessante, principalmente para quem só tem conhecimento das premissas freudianas.), representação social, dicussão de gênero e afins hasta categorias da filmografia pornô, como soft_porn e hardcore.

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fériasfériasférias! Preciso de férias.

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sábado, 5 de junho de 2004

.:: Por Trás ::.

Este é um dos títulos dos filmes em exibição no local onde estou fazendo minha mono[porn]grafia para uma das disciplinas de antropologia lá na UFRGS. Aos poucos, irei colocando no ar alguns fragmentos do trabalho, no caso de hoje, um trecho dos meus diários de campo. Have Fun!

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TRABALHO DE CAMPO 2004/1 – TREINANDO A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE (DESENHO DA PESQUISA)

- OBJETIVO: traçar o perfil do freqüentador do Cine Atlas (Júlio de Castilhos, 450, Centro, Porto Alegre), especializado na exibição de filmes de longa metragem do gênero pornográfico.

- MÉTODO: etnográfico, com uso das técnicas de observação participante; entrevistas; semi-estruturadas; imagens.

- AMOSTRA EXTRAÍDA DE UM DOS DIÁRIOS:

“Quinta-feira, 27 de maio de 2004.

São poucos minutos passados da uma hora da tarde, conforme aponta o relógio do mercado público de Porto Alegre, local onde me encontro. É a primeira vez que vou a campo e confesso que estou dotada de um certo nervosismo, visto que estou prestes a mergulhar em um universo que mal conheço, baseada apenas em algumas reportagens superficiais que encontrei sobre o assunto e irrisório conhecimento antropológico na área. Sigo, à pé, sozinha, à procura das imediações do Cine Atlas, caminho este que só conheci em função do itinerário do ônibus da linha Campus/Ipiranga (que parte do mercado e passa em frente ao local). Estou um pouco confusa, afinal, já percorri praticamente toda rua Voluntários da Pátria e não encontrei o cinema que estava procurando. Passam-se alguns minutos até que eu, atordoada com o barulho, poluição visual e com a constante movimentação de camelôs e pedintes, recordo-me que a rua correta é a paralela, uma quadra abaixo em direção ao lago Guaíba, a Júlio de Castilhos. Estou indo para lá.

Alguns fatos me ocorrem neste instante. Percebo que hoje é um dia útil, quinta-feira, entre uma e duas da tarde, pleno horário de trabalho da população comum. Faz 16°C num típico dia de outono, ensolarado, porém com uma brisa bastante fria que sopra do lago para a parte continental. A grande maioria das pessoas com as quais cruzo nas ruas estão bem agasalhadas, jaquetas de couro ou lã, calças compridas, chapéus e mantas estão por todos os lados. Imagino que isso seja um dado importante a ser apontado, afinal, quem é esta pessoa que enfrenta intempéries ou pára tudo em horário comercial para assistir a longos filmes de sexo explícito? Provavelmente não seja o mesmo freqüentador que, num cálido dia de verão em férias do trabalho, resolve lançar mão de um passatempo como esse. Enfim, por enquanto não há nada de concreto, são meras especulações.

Já avisto o local na próxima quadra e me percebo fascinada diante dele. O cinema está localizado numa das áreas mais movimentadas (*durante o dia, porque à noite a circulação de pessoas é quase inexistente, situação decorrente do fato do bairro há muito tempo ter deixado de ser residencial), antigas (*há uma grande concentração de edificações que datam da fundação da cidade) e “heterogêneas” (*no sentido de ali conviverem pessoas de realidades econômicas e sócio-culturais tão distintas) de Porto Alegre, o Centro. Poderia dizer, até, que é o ponto médio entre instituições de realidade verdadeiramente anacrônicas: entre a estação rodoviária e a prefeitura; entre os maiores templos de igrejas evangélicas da cidade (Internacional da Graça de Deus e Universal do Reino de Deus) e os inúmeros escritórios de empresas privadas e públicas; entre os estacionamentos que abrigam carros importados caríssimos e os incontáveis terminais de ônibus nas proximidades do mercado público e o principal ponto de embarque/desembarque da estação do trem (eixo POA – São Leopoldo); entre o comércio que atua legalmente e a legião de ambulantes que se atropelam na disputa por fregueses... Quanto antagonismo! É um dos poucos lugares da capital gaúcha onde uma livraria é freqüentada pelo erudito, que deixa o recinto com uma sacola repleta de livros, e o analfabeto, cego, que na porta, do lado de fora, vende bilhetes para o sorteio da Mega Sena, que está acumulada. Enfim, se pudesse eternizar este momento, creio que obteria um exemplo de retrato-síntese da realidade da população brasileira, tão díspar em si mesma.

E é pensando nesse contexto que chego na Júlio de Castilhos, 447. Resolvo entrar, porque me parece um ambiente confortável para observar, visto que há mesas e cadeiras ociosas ali. Já estou em frente ao Cine Atlas, no lado oposto da rua. O local pelo qual optei é um restaurante/ bar chamado “Restaurante e Lancheria Stoney”. Peço uma água com gás, onde gasto R$1,30, e me dirijo a uma das mesas a fim de iniciar as minhas anotações. Primeiramente, parece-me pertinente descrever algumas características acerca do local. É um bar que classificaria como popular, dado que constato em função: 1) dos baixos preços dos produtos oferecidos, “Buffet livre c/ 1 carne = 3,90”, conforme o anúncio, por exemplo; pela marca de maços de cigarro que estampa o painel acima da velha e empoeirada caixa registradora, “DERBY” (R$1,60), uma das mais baratas no mercado; ou pelas bebidas que estão expostas nas três prateleiras, mais adiante, improvisadas e anexadas à parede, como cachaças artesanais (algumas sem rótulo e outras de marcas conhecidas, como a “61”), vinhos tintos e brancos (cujas marcas não enxergo de onde estou sentada), uma garrafa de “CAMPARY” e outra de uísque “Natu Nobilis”, sendo esta a garrafa de bebida alcoólica mais cara oferecida na casa, entretanto uma das mais baratas - desse gênero - encontradas nos hiper ou supermercados porto alegrenses; 2) da decoração, bastante simples e antiga, não planejada e, provavelmente, aleatória (no caso da distribuição da mobília e dos painéis). Aliás, não consigo distinguir se há tinta ou não cobrindo o reboco das paredes, pois a iluminação é bastante precária; quanto a um dos balcões, o dos doces artesanais, está remendado com fita adesiva, dificultando a visão dos produtos pelos clientes. Curioso, existem cinco máquinas caça-níqueis no recinto que estão dispostas entre a estante dos salgadinhos e o refrigerador que contém bebidas gasosas não alcoólicas. 3) dos atendentes e do atendimento, um tanto desqualificado. O homem que me atendeu, por exemplo, vestia um guarda-pó azul, padrão no local, mas um tanto “gasto”, sem camisa por baixo, de modo que podia ver uma parte do seu colo. Ele também mantinha uma caneta “Bic” atrás de uma das orelhas enquanto me atendia e mascava um palito de dentes. (...)”